STJ define termo inicial para quitação de dívida em ações de busca e apreensão

STJ Define Termo Inicial para Quitação em Ações de Busca e Apreensão

Uma consumidora celebrou contrato de financiamento de veículo com garantia de alienação fiduciária com um banco. Posteriormente, a consumidora deixou de pagar as parcelas do contrato, configurando inadimplemento. Diante da mora, o banco ajuizou ação de busca e apreensão contra a consumidora, obtendo liminar para apreender o veículo objeto da garantia fiduciária. Contudo, surgiu controvérsia sobre quando efetivamente começaria a contar o prazo de cinco dias que a lei concede ao devedor para quitar integralmente a dívida: se a partir da execução da medida liminar ou se somente após a intimação da consumidora sobre a apreensão do bem.

O Raciocínio Jurídico da Decisão

Qual foi a principal tese jurídica fixada pelo STJ neste caso?

O STJ fixou que nas ações de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente, o prazo de cinco dias para pagamento da integralidade da dívida começa a fluir a partir da data da execução da medida liminar. Primeiramente, o tribunal estabeleceu que este entendimento aplica-se de forma vinculante em todo território nacional, tendo sido aprovado no Tema Repetitivo nº 1.279. Além disso, a decisão pacificou divergência existente entre tribunais estaduais sobre o marco inicial deste prazo processual.

Em qual dispositivo legal o tribunal se baseou para fundamentar sua decisão?

A decisão fundamentou-se principalmente no artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei nº 911/69, que estabelece que “cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário”. Simultaneamente, o tribunal considerou que este dispositivo constitui norma especial em relação ao artigo 230 do Código de Processo Civil, que trata da contagem geral de prazos processuais.

Por que o STJ afastou a aplicação das regras gerais do CPC sobre contagem de prazos?

O STJ aplicou o princípio da especialidade para resolver o conflito normativo entre a legislação especial e a geral. Entretanto, o tribunal reconheceu que o CPC estabelece em seu artigo 230 que os prazos começam a contar da citação, intimação ou notificação. Por outro lado, destacou que o Decreto-Lei nº 911/69 contém regulamentação específica para ações de busca e apreensão fiduciária. Finalmente, fundamentou-se na doutrina de Norberto Bobbio sobre especialidade normativa, citando que “lei especial é aquela que anula uma lei mais geral”.

Qual a natureza jurídica da mora discutida no caso?

O STJ caracterizou a situação como mora ex re, baseando-se no artigo 397 do Código Civil. Primeiramente, explicou que nesta modalidade de mora, “o inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor”. Além disso, esclareceu que na mora ex re os efeitos do inadimplemento operam automaticamente após o vencimento da obrigação. Posteriormente, ressaltou que o devedor já possui prévia ciência da data de vencimento, dispensando notificação complementar.

Como o STJ tratou o argumento sobre a necessidade de intimação do devedor?

O tribunal rejeitou o argumento de que seria necessária intimação prévia do devedor sobre a execução da liminar. Primeiramente, destacou que a ação de busca e apreensão é necessariamente precedida de notificação extrajudicial do devedor fiduciante. Entretanto, esclareceu que a legislação especial não faz distinção sobre a detenção efetiva do bem quando do cumprimento da liminar. Finalmente, argumentou que a execução da liminar produz seus efeitos independentemente do bem estar em poder do devedor ou de terceiros.

Qual precedente jurisprudencial o STJ utilizou para embasar sua decisão?

O STJ citou precedente do Tema Repetitivo nº 722 (REsp nº 1.418.593/MS), julgado em 2014. Primeiramente, este precedente já havia estabelecido que o devedor deve pagar a integralidade da dívida no prazo de cinco dias após a execução da liminar. Além disso, mencionou julgados mais recentes da Terceira Turma que reiteraram este entendimento, como o REsp nº 1.933.739/RS de 2021. Simultaneamente, demonstrou jurisprudência consolidada sobre o tema em diferentes órgãos julgadores do tribunal.

Conclusão

Nas ações de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente, o prazo de 5 dias para pagamento da integralidade da dívida, previsto no art. 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911/69, começa a fluir a partir da data da execução da medida liminar.

(STJ. Segunda Seção. REsp 2.126.264. Min. Relator Antonio Carlos Ferreira. julgado em 07/08/2025) [inf. 860] [tema repetitivo 1.279]

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STJ define que módulo urbano municipal não impede usucapião extraordinária

Tese Fixada

O reconhecimento da usucapião extraordinária, mediante o preenchimento dos requisitos específicos, não pode ser obstado em razão da área usucapienda ser inferior ao módulo estabelecido em lei municipal. (STJ. 2ª Seção. REsp nº 1.667.842/SC. Julgado em 30/03/2021) [Tema repetitivo 985]

Contexto Fático

A questão da usucapião extraordinária módulo urbano municipal chegou ao STJ através de caso envolvendo João Silva e Maria Santos. Primeiramente, o casal ajuizou ação alegando possuir o lote 33 do Loteamento Jardim das Flores há mais de vinte anos. Além disso, exerciam posse mansa, pacífica e com animus domini sobre imóvel de 280 m². Entretanto, o Ministério Público se opôs, argumentando que a área era inferior ao módulo mínimo municipal. Consequentemente, surgiu a controvérsia central: pode a usucapião extraordinária módulo urbano municipal sofrer impedimentos por legislação local que estabelece área mínima?

Fundamentos Jurídicos

O tribunal fundamentou sua decisão estabelecendo que a usucapião extraordinária módulo urbano municipal não pode sofrer restrições adicionais. O STJ enfatizou que o instituto é regido exclusivamente pelos requisitos do artigo 1.238 do Código Civil, exigindo apenas posse com animus domini por quinze anos. Inicialmente, destacou-se que a usucapião extraordinária módulo urbano municipal constitui modo originário de aquisição da propriedade, fundamentado na função social da propriedade prevista no artigo 5º, XXIII, da Constituição Federal.

Ademais, a competência legislativa estabelecida pela CF/88 foi determinante na decisão sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal. Conforme o artigo 22, inciso I, compete privativamente à União legislar sobre Direito Civil, enquanto aos municípios cabe o ordenamento territorial (art. 30, VIII, CF/88). Portanto, questões sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal não podem ter requisitos alterados por legislação municipal, pois extrapolam a competência local.

O tribunal invocou precedente do STF no RE nº 422.349/RS sobre usucapião especial urbana para decidir sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal. Aplicando os mesmos fundamentos, concluiu-se que a usucapião extraordinária módulo urbano municipal não pode sofrer obstáculos de legislação infraconstitucional. Desta forma, a discussão sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal deve se basear exclusivamente nos requisitos federais estabelecidos.

Finalmente, ressaltou-se que a função social da propriedade se concretiza pela regularização de posses na usucapião extraordinária módulo urbano municipal. Impedir tal instituto contrariaria seus fundamentos, visando à segurança jurídica. A decisão sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal privilegia o direito constitucionalmente assegurado à propriedade sobre limitações infralegais, consolidando importante entendimento jurisprudencial sobre a matéria.

Outros temas repetitivos

Tema Repetitivo 1278 do STJ

Tese Fixada

Em decorrência dos objetivos da execução penal, a leitura pode resultar na remição de pena, com fundamento no art. 126 da Lei de Execução Penal, desde que observados os requisitos previstos para sua validação, não podendo ser acolhido o atestado realizado por profissional contratado pelo apenado. (STJ. 3ª Seção. REsp 2.121.878/SP. Julgado em 15/08/2025) [Inf. 859] [Tema Repetitivo 1.278]

Contexto Fático

O apenado Carlos Silva, cumprindo pena em estabelecimento prisional de São Paulo, solicitou remição de pena baseada na leitura de diversas obras literárias. Para tanto, apresentou duas modalidades de comprovação: por um lado, algumas leituras foram supervisionadas pela Secretaria de Administração Penitenciária do Estado, com resenhas avaliadas pela comissão técnica da unidade prisional; por outro lado, outras foram atestadas por pedagoga particular contratada por ele.

Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento ao agravo em execução, indeferindo integralmente o pedido de remição, uma vez que argumentou que a leitura não se enquadrava no conceito de “estudo” previsto no art. 126 da Lei de Execução Penal. Em consequência, a defesa recorreu ao STJ sustentando interpretação ampla do termo “estudo” e, além disso, invocando a Resolução nº 391/2021 do CNJ. Portanto, a questão central a ser resolvida: é possível obter remição de pena pela leitura e quais os requisitos necessários para sua validação?

Fundamento Jurídico

O tribunal fundamentou sua decisão no princípio da finalidade ressocializadora da execução penal e na interpretação teleológica das normas executórias penais. De fato, o STJ consolidou entendimento sobre a remição de pena pela leitura, reconhecendo-a como modalidade de estudo apta a gerar o benefício da remição, desde que observados critérios rigorosos de validação.

Nesse sentido, o raciocínio jurídico adotado baseou-se na interpretação analógica in bonam partem do art. 126 da Lei de Execução Penal, ampliando o conceito de “estudo” para abranger a leitura como atividade educacional. Assim sendo, o tribunal destacou que seria contrassenso excluir a leitura do conceito de estudo, considerando que “ler é o principal método para estudar e aprender”, sendo essencial para a reforma do ser humano. Por conseguinte, a Corte invocou os objetivos da execução penal previstos no art. 1º da LEP, que visa “proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado”.

Além disso, a decisão teve respaldo na jurisprudência do STF (HC 190.806-AgR) e precedentes das 5ª e 6ª Turmas do STJ, que já admitiam a remição por leitura. Simultaneamente, o tribunal mencionou a ADPF 347, que reconheceu o “Estado de Coisas Inconstitucional” no sistema carcerário, justificando medidas que promovam melhoramento das condições prisionais. Todavia, estabeleceu-se requisito fundamental: a validação deve ser feita exclusivamente por Comissão de Validação instituída pelo Poder Público, conforme Resolução nº 391/2021 do CNJ. Consequentemente, foram rejeitados atestados de profissionais contratados pelo apenado, garantindo imparcialidade e controle qualitativo.

Fundamentos Constitucionais

• Art. 5º, IX, da Constituição Federal – Liberdade de expressão e vedação à censura
• Art. 6º da Constituição Federal – Direito fundamental à educação
• Arts. 205 e seguintes da Constituição Federal – Direito à educação como garantia de todos e dever do Estado
• Art. 220, § 2º, da Constituição Federal – Vedação à censura de obras literárias, religiosas, filosóficas ou científicas

Fundamentos Convencionais

• Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), art. 5º, item 6 – Finalidade essencial de reforma e readaptação social dos condenados
• Regras de Mandela (Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos) – itens 24-2, 41, 64, 92, 104, 105 e 117
• Regras de Bangkok (Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas)
• Regras de Tóquio (Regras Mínimas das Nações Unidas para Medidas Não Privativas de Liberdade)

Fundamentos Legais

• Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), art. 1º – Objetivos da execução penal
• Lei de Execução Penal, art. 126 – Remição de pena por trabalho ou estudo
• Lei de Execução Penal, arts. 17 a 21, 41 – Direito à educação, cultura e atividades intelectuais
• Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/1942), art. 5º – Fins sociais da lei
• Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996)
• Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005/2014)

Normas do CNJ

• Resolução CNJ nº 391/2021 – Regulamentação da remição de pena por práticas educativas
• Recomendação CNJ nº 44/2013 – Diretrizes sobre remição de pena pela leitura

Outros repetitivos do STJ