STJ define que módulo urbano municipal não impede usucapião extraordinária

Tese Fixada

O reconhecimento da usucapião extraordinária, mediante o preenchimento dos requisitos específicos, não pode ser obstado em razão da área usucapienda ser inferior ao módulo estabelecido em lei municipal. (STJ. 2ª Seção. REsp nº 1.667.842/SC. Julgado em 30/03/2021) [Tema repetitivo 985]

Contexto Fático

A questão da usucapião extraordinária módulo urbano municipal chegou ao STJ através de caso envolvendo João Silva e Maria Santos. Primeiramente, o casal ajuizou ação alegando possuir o lote 33 do Loteamento Jardim das Flores há mais de vinte anos. Além disso, exerciam posse mansa, pacífica e com animus domini sobre imóvel de 280 m². Entretanto, o Ministério Público se opôs, argumentando que a área era inferior ao módulo mínimo municipal. Consequentemente, surgiu a controvérsia central: pode a usucapião extraordinária módulo urbano municipal sofrer impedimentos por legislação local que estabelece área mínima?

Fundamentos Jurídicos

O tribunal fundamentou sua decisão estabelecendo que a usucapião extraordinária módulo urbano municipal não pode sofrer restrições adicionais. O STJ enfatizou que o instituto é regido exclusivamente pelos requisitos do artigo 1.238 do Código Civil, exigindo apenas posse com animus domini por quinze anos. Inicialmente, destacou-se que a usucapião extraordinária módulo urbano municipal constitui modo originário de aquisição da propriedade, fundamentado na função social da propriedade prevista no artigo 5º, XXIII, da Constituição Federal.

Ademais, a competência legislativa estabelecida pela CF/88 foi determinante na decisão sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal. Conforme o artigo 22, inciso I, compete privativamente à União legislar sobre Direito Civil, enquanto aos municípios cabe o ordenamento territorial (art. 30, VIII, CF/88). Portanto, questões sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal não podem ter requisitos alterados por legislação municipal, pois extrapolam a competência local.

O tribunal invocou precedente do STF no RE nº 422.349/RS sobre usucapião especial urbana para decidir sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal. Aplicando os mesmos fundamentos, concluiu-se que a usucapião extraordinária módulo urbano municipal não pode sofrer obstáculos de legislação infraconstitucional. Desta forma, a discussão sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal deve se basear exclusivamente nos requisitos federais estabelecidos.

Finalmente, ressaltou-se que a função social da propriedade se concretiza pela regularização de posses na usucapião extraordinária módulo urbano municipal. Impedir tal instituto contrariaria seus fundamentos, visando à segurança jurídica. A decisão sobre usucapião extraordinária módulo urbano municipal privilegia o direito constitucionalmente assegurado à propriedade sobre limitações infralegais, consolidando importante entendimento jurisprudencial sobre a matéria.

Outros temas repetitivos

Tema Repetitivo 1278 do STJ

Tese Fixada

Em decorrência dos objetivos da execução penal, a leitura pode resultar na remição de pena, com fundamento no art. 126 da Lei de Execução Penal, desde que observados os requisitos previstos para sua validação, não podendo ser acolhido o atestado realizado por profissional contratado pelo apenado. (STJ. 3ª Seção. REsp 2.121.878/SP. Julgado em 15/08/2025) [Inf. 859] [Tema Repetitivo 1.278]

Contexto Fático

O apenado Carlos Silva, cumprindo pena em estabelecimento prisional de São Paulo, solicitou remição de pena baseada na leitura de diversas obras literárias. Para tanto, apresentou duas modalidades de comprovação: por um lado, algumas leituras foram supervisionadas pela Secretaria de Administração Penitenciária do Estado, com resenhas avaliadas pela comissão técnica da unidade prisional; por outro lado, outras foram atestadas por pedagoga particular contratada por ele.

Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento ao agravo em execução, indeferindo integralmente o pedido de remição, uma vez que argumentou que a leitura não se enquadrava no conceito de “estudo” previsto no art. 126 da Lei de Execução Penal. Em consequência, a defesa recorreu ao STJ sustentando interpretação ampla do termo “estudo” e, além disso, invocando a Resolução nº 391/2021 do CNJ. Portanto, a questão central a ser resolvida: é possível obter remição de pena pela leitura e quais os requisitos necessários para sua validação?

Fundamento Jurídico

O tribunal fundamentou sua decisão no princípio da finalidade ressocializadora da execução penal e na interpretação teleológica das normas executórias penais. De fato, o STJ consolidou entendimento sobre a remição de pena pela leitura, reconhecendo-a como modalidade de estudo apta a gerar o benefício da remição, desde que observados critérios rigorosos de validação.

Nesse sentido, o raciocínio jurídico adotado baseou-se na interpretação analógica in bonam partem do art. 126 da Lei de Execução Penal, ampliando o conceito de “estudo” para abranger a leitura como atividade educacional. Assim sendo, o tribunal destacou que seria contrassenso excluir a leitura do conceito de estudo, considerando que “ler é o principal método para estudar e aprender”, sendo essencial para a reforma do ser humano. Por conseguinte, a Corte invocou os objetivos da execução penal previstos no art. 1º da LEP, que visa “proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado”.

Além disso, a decisão teve respaldo na jurisprudência do STF (HC 190.806-AgR) e precedentes das 5ª e 6ª Turmas do STJ, que já admitiam a remição por leitura. Simultaneamente, o tribunal mencionou a ADPF 347, que reconheceu o “Estado de Coisas Inconstitucional” no sistema carcerário, justificando medidas que promovam melhoramento das condições prisionais. Todavia, estabeleceu-se requisito fundamental: a validação deve ser feita exclusivamente por Comissão de Validação instituída pelo Poder Público, conforme Resolução nº 391/2021 do CNJ. Consequentemente, foram rejeitados atestados de profissionais contratados pelo apenado, garantindo imparcialidade e controle qualitativo.

Fundamentos Constitucionais

• Art. 5º, IX, da Constituição Federal – Liberdade de expressão e vedação à censura
• Art. 6º da Constituição Federal – Direito fundamental à educação
• Arts. 205 e seguintes da Constituição Federal – Direito à educação como garantia de todos e dever do Estado
• Art. 220, § 2º, da Constituição Federal – Vedação à censura de obras literárias, religiosas, filosóficas ou científicas

Fundamentos Convencionais

• Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), art. 5º, item 6 – Finalidade essencial de reforma e readaptação social dos condenados
• Regras de Mandela (Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Presos) – itens 24-2, 41, 64, 92, 104, 105 e 117
• Regras de Bangkok (Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas)
• Regras de Tóquio (Regras Mínimas das Nações Unidas para Medidas Não Privativas de Liberdade)

Fundamentos Legais

• Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), art. 1º – Objetivos da execução penal
• Lei de Execução Penal, art. 126 – Remição de pena por trabalho ou estudo
• Lei de Execução Penal, arts. 17 a 21, 41 – Direito à educação, cultura e atividades intelectuais
• Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/1942), art. 5º – Fins sociais da lei
• Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996)
• Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005/2014)

Normas do CNJ

• Resolução CNJ nº 391/2021 – Regulamentação da remição de pena por práticas educativas
• Recomendação CNJ nº 44/2013 – Diretrizes sobre remição de pena pela leitura

Outros repetitivos do STJ